terça-feira, 19 de março de 2013

Valorizar os que se Destacam

O valor do mito.

Charles Evaldo Boller


O maçom reconhece o valor dos heróis, aos quais presta homenagem e até culto, para que, do exemplo destes construir valor próprio; autovalor prezado de onde emana autoconhecimento que abre caminho para a liberdade e condição aperfeiçoada de vida. Herói é ideal; modelo a ser seguido.

Jesus Cristo foi crucificado em resultado de seus pensamentos discordantes com os mandatários de seu povo; desobedeceu ao poder constituído; morto, constituiu-se mártir. O alferes Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, foi enforcado e esquartejado porque lhe imputaram a liderança do movimento contra o extorsivo imposto da coroa portuguesa; morto, não passava de lesa-pátria.

Qual é a diferença entre os dois? Qual deles foi herói? Jesus é ícone; símbolo e mito que levou os cristãos a abrirem os olhos para a luz de significado inefável. Um símbolo que induz ao cérebro a ser convencido para a harmonia do Universo. Tiradentes foi criado para transformar-se em ídolo. Inclusive é representado nas pinturas oficiais com semelhança a Jesus Cristo para transmitir a ideia de herói. Fizeram dele mártir, herói. No Brasil, depois da expulsão da família real e mudança para o sistema republicano, surgiu a necessidade de criar-se um ícone, em substituição à família real, que movesse o coração do povo no sentido de criar um pensamento de hegemonia nacional, um sentimento pátrio. Os militares da época conceberam a figura de Tiradentes como herói nacional.

Qual desses dois ícones destaca-se como modelo a ser seguido? Qual deles impõe uma ordem moral? Se herói é aquele que faz o cidadão crescer como pessoa em sentido intelectual ou moral, então os dois símbolos tocam centros vitais que estão fora do contexto da comunicação da razão. Ambos despertam sentimentos impossíveis de explicar com a razão e impõe uma ordem moral, cada um a sua maneira. O primeiro, busca a Luz interior, o segundo, justifica um sistema de governo do homem pelo homem. Ambos são bons. Um é natural, o outro artificial. A completude do homem é forjada quando o herói, o símbolo, modifica-o em seus diversos aspectos para a vida e busca da felicidade. Mesmo o herói forjado numa mentira histórica carrega uma mensagem, um símbolo que voltado para a imposição de uma ordem moral que modifica, sustenta. Se a sociedade, onde o homem está imerso, vive em conflito, não existe felicidade. O ícone muda isso. Diversos são os caminhos para alcançar este objetivo. Uma delas é a razão alicerçada na espiritualidade. Jesus desperta os valores internos. O herói fabricado, a exemplo de Tiradentes, forja valores para criar o espírito de corpo da tribo, da comunidade, da identidade do povo; nem interessa mais se o que lhe deu origem seja verdade ou mentira, interessa apenas o símbolo, o efeito modificador e unificador promovido pelo mito.

Nesta vida, o homem procura significado na experiência de estar vivo no plano físico. E isto é realizado de tal maneira que a experiência exterior tenha reflexos imediatos em seu interior, corroborado com a percepção da realidade mais íntima, de tal forma a conceber a percepção de estar vivo. Esta formação de ideias está dentro de cada um; é a utilidade dos mitos, ícones, símbolos e heróis que traduzem uma mensagem de valor moral que faz crescer e justificar a experiência da vida. Todos os conhecimentos nascem da experiência; o conhecimento não antecede a experiência. Mito é a manifestação de um poder modificador, ou sistema de valores aplicável ao indivíduo ou ao Universo. É da experiência que nasce a metáfora da capacidade espiritual humana, aplicável tanto para vida animada como inanimada. O conhecimento empírico nasce das impressões dos sentidos, é onde o mito estabelece relação com a natureza, o mundo natural onde o homem busca sua significação ou a interação com determinada sociedade.

Se a sociedade humana está às voltas com dificuldades, é porque eliminou mitos que edificam ordens morais e nada colocaram em seu lugar. Acabam com Tiradentes, Cristo e outros ícones para submeter-se às paixões do mundo virtual, no qual nem humanidade nem divindade são perceptíveis. A tradição perdeu-se. Não se possui nada para colocar em seu lugar. Os heróis sempre deram sustentação para a vida do homem. Civilizações foram moldadas e criadas com ícones que duravam gerações. O indivíduo tinha tempo para analisar e solucionar os profundos mistérios da caminhada pela vida. Como hodiernamente o homem não tem o que colocar no lugar dos mitos destruídos pela razão sem espiritualidade, terá de identificar os mais diversos sinais que encontrar pelo caminho para formar sua significação existencial. Enquanto isso, ele sofre com as crises existenciais.

Valorizando os ícones, dos homens que se destacam, e calcado no comportamento ético-maçônico o maçom é bem-sucedido nos diversos segmentos de sua atuação. Caminha com as forças de suas próprias pernas porque respeita os símbolos; regras construídas a partir do autoconhecimento ético, cuja jornada iniciou em seus primeiros passos na Maçonaria. Isto promove autodesenvolvimento em todas as frentes e iniciativas em que se lança. Resulta em bem-estar, boa consciência, ambiente fraterno, progresso profissional e financeiro. A mudança social cria a ética congruente com o desenvolvimento de comportamentos de investimento e poupança; é o que define a acumulação de capital e exerce papel determinante como forma de acumulação da riqueza e sucesso material.

O exemplo daquele ícone que se destaca na vida baseada na ética maçônica promove autoeducação ao homem que o emita. Isto se traduz em conforto e bem-estar debaixo de ambiente fraterno. Para caminhar em sociedade onde se obtenham estas condições, há necessidade de construir o homem em todas as suas características internas e externas. Para isso carece-se de modelos, ícones e heróis. Daí a razão do maçom homenagear os heróis. Valorizar os que se destacam é a forma de desenvolver e facilitar a construção de ordens morais que culminam no bem viver.

A Maçonaria estabelece o ambiente próprio onde relacionamentos se fortalecem, heróis são respeitados e homenageados e o amor, o laço do perfeito vínculo de união e fraternidade vigora. A experiência traz conhecimento que se traduz em amor fraterno, característica que foi colocada no coração do homem pelo Grande Arquiteto do Universo.


Bibliografia

1. CAMPBELL, Joseph, As Máscaras de Deus, Mitologia Criativa, tradução: Carmen Fischer, ISBN 978-85-60804-10-8, primeira edição, Palas Athena Editora, 624 páginas, São Paulo, 2010;

2. KANT, Immanuel, Crítica da Razão Pura, tradução: Fulvio Lubisco, Lucimar A. Coghi Anselmi, ISBN 978-85-274-0927-8, primeira edição, Ícone Editora, 542 páginas, São Paulo, 2011;

3. ROHDEN, Humberto, Orientando para a Autorealização, primeira edição, Alvorada Editora e Livraria Limitada, 156 páginas, São Paulo, 1989;

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